segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

O Homem como Macrocosmo

Por São Nicodemos Hagioarita

Você deve lembrar, caro leitor, que Deus criou primeiro o mundo invisível e depois o visível, ''de modo a revelar uma maior sabedoria e o múltiplo propósito da natureza'', como São Gregório Teólogo notou. Deus criou também por último o homem, com uma alma invisível e um corpo visível. Ele, portanto, criou o homem para que fosse um cosmos, um mundo em si mesmo, mas não um microcosmos no interior de um mundo maior, como o filósofo Demócrito declarou e outros filósofos também mantiveram. Tais filósofos consideravam o homem um microcosmos, minimizando e restringindo seu valor e perfeição no interior deste mundo visível. Deus, pelo contrário, fez do homem uma forma de macrocosmos -- um ''mundo maior'' dentro do menor. Ele é de fato um mundo maior em virtude da multidão de poderes que possui, especialmente os poderes da razão, do espírito, e da vontade, que este grande e visível mundo não possui. Daí porque São Gregório Teólogo afirma mais de uma vez que ''Deus fez este segundo cosmos (isto é, o homem) para ser sobre a terra como um grande mundo dentro de um mundo pequeno.'' Mesmo quando o homem é comparado com o mundo invisível dos anjos, de novo é ele chamado de ''mundo maior'' em comparação com o qual o mundo invisível é pequeno. O homem inclui em seu mundo tanto o visível quanto o invisível, enquanto o mundo angélico não inclui os elementos do mundo visível. São Gregório Palamas notou que este cosmos (isto é, o homem) adorna ambos os mundos, o visível e o invisível. Nemésio também concluiu que o homem enquanto cosmos une os fins dos dois mundos, aquele mais elevado e o menos elevado, e então revela que o Criador de ambos é Um.

De modo a ter uma compreensão maior deste assunto, deixe-me usar o seguinte exemplo: o corpo é semelhante a um palácio real construído pela soberba habilidade arquitetônica de um Criador Onisciente. Este palácio inclui o ''salão principal'', a cabeça, a câmera mais interior, que é o coração; os mensageiros, que são os pensamentos; as passagens, que são os nervos; e as portas do palácio, que são os cinco sentidos. A alma (ou antes a mente, pois a alma purificada se torna toda ela mente, segundo São Kallistos), deve ser entendida como uma espécie de rei que é mantido pelos três poderes mais gerais, o do espírito, da mente e da vontade. Este ''rei'' se encontra em todas as partes do corpo, do mesmo modo que o fogo é encontrado na totalidade de um ferro aquecido. Ele escreveu que ''a alma inteira está unida ao corpo todo, e não a parte de uma com uma parte do outro; e a alma não está contida no corpo, mas antes contém o corpo assim como o fogo contém o ferro''. Agora, de uma maneira extraordinária, este rei tem o cérebro como órgão de sua atividade mental; seu poder de razão, e de querer, e de fato sua essência mesma se encontra no coração, como veremos nos capítulos adiante. Este rei possui também um mapa, a agulha de sua imaginação, para escrever tudo o que entra em sua mente vindo do exterior, pelos portais dos sentidos.

Você visualizou estes temas com sua imaginação? Note agora, como disseram alguns, como este rei, que é a alma, se torna simples, puro, integral, e luz racional de acordo com sua natureza, tão logo é vertido para o interior deste corpo de perfeita organização. Antes do Santo Batismo, a mente, estando coberta pela escuridão do pecado original, não via claramente. Mas após o Santo Batismo, a mente se torna toda luz, refletindo a luz supranatural da Graça Divina. Como São João Crisóstomo disse, a mente brilha mais do que os raios do sol, na medida em que permanece acima da escuridão da pecaminosidade voluntária. Pois é assim que aquela língua boa e eloquente interpretou a palavra apostólica: ''Mas todos nós temos o rosto descoberto, refletimos como num espelho a glória do Senhor e nos vemos transformados nesta mesma imagem, sempre mais resplandecentes, pela ação do Espírito do Senhor." (2 Cor. 3:18). Interpretando esta passagem, escreveu São João Crisóstomo:

"O que é o reflexo da glória do Senhor e a transformação à sua semelhança? Isto é mais claramente indicado quando Ele revela a graça dos milagres. E no entanto isto não é difícil de ver mesmo agora para aqueles que tem os olhos da fé. Pois tão logo somos batizados a alma brilha mais resplandecente do que o sol, sendo purificada pelo Espírito Santo. E não apenas vemos a glória de Deus como recebemos dela um certo esplendor de modo semelhante a um pedaço límpido de prata que reflete os raios de sol que recebe. Mas que pena! Só podemos suspirar amargamente! Pois esta glória inefável e maravilhosa permanece conosco apenas por um ou dois dias. Pois nós a extinguimos, arrastados que somos pelo inverno dos cuidados mundanos, as nuvens densas que bloqueiam seus raios. Pois os cuidados dos vivos são de fato um pesado inverno, e ainda mais sombrios do que o próprio inverno.''

O atributo essencial e natural da mente, justamente porque é mente, é estar sempre ocupada com os assuntos espirituais a ela relacionados; porque é imaterial com o imaterial; porque é imortal com o imortal. Em uma palavra, a mente deve se ocupar com o que é verdadeiramente bom e ter apenas estas coisas para sua nutrição, crescimento e deleite. Por contraste, o atributo natural do corpo, porque é corpo, é se inclinar para o que é só aparentemente bom e ter estas coisas como alimento, crescimento e deleite. Por isso São Gregório de Nissa diz: ''Na natureza humana, o prazer possui um caráter dual. Na alma é ativado pela impassibilidade, e no corpo pela paixão. Aquele que nosso livre arbítrio escolher dominará sobre o outro''. Mesmo que o corpo, na medida em que é um corpo, seja naturalmente inclinado aos prazeres derivados das coisas físicas, deve ser no entanto conduzido, governado e controlado pela mente (alma) quando a razão é íntegra e completa. De acordo com São João Damasceno, a diferença entre a alma racional e irracional é esta: a alma irracional é guiada e governada pelo corpo e pelos sentidos, enquanto a alma racional guia e governa o corpo e os sentidos. Assim, foi determinado por Deus que o racional governe o irracional, e que o melhor domine sobre o pior e retenha os movimentos instintivos deste último. Daí porque quando o corpo tem um desejo, não se lança imediatamente em ação para satisfazê-lo, mas é obstruído pela mente hegemônica. Estas são as palavras de São João Damasceno: ''as criaturas irracionais não são autônomas; elas não conduzem, mas são conduzidas pela natureza. Daí porque não objetam ao desejo físico, mas são arrastadas à ação tão logo o sintam. O homem, entretanto, sendo racional, conduz a natureza ao invés de ser por ela conduzido. Assim, quando desejamos algo, temos autoridade para suplantar este desejo ou para segui-lo.''


Tradução de André Luiz dos Reis.

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