terça-feira, 7 de fevereiro de 2017

A Teologia da Igreja Ortodoxa


A teologia da Igreja Oriental distingue em Deus as três hipóstases, a natureza ou essência, e as energias. O Filho e o Espírito Santo são, por assim dizer, procissões pessoais, as energias são procissões naturais. As energias são inseparáveis da natureza, e a natureza é inseparável das três pessoas. Essas distinções são de grande importância para o conceito de vida mística para a Igreja Oriental:

1. A doutrina das energias, inefável distinção da essência, é a base dogmática do real carácter de toda experiência mística. Deus, que é inacessível em sua essência, é presente em Suas energias “como em um espelho”, permanecendo invisível naquilo que Ele é; ‘do mesmo modo que somos capazes de ver nossas faces, sendo eles invisíveis para nós em um corpo’, de acordo com um dito de S. Gregório Palamas. Completamente desconhecido em Sua essência, Deus revela-se completamente em Suas energias, que de nenhum modo dividem Sua natureza em duas partes – cognoscível e incognoscível – mas significa dois modos diferentes de sua existência divina, na essência e fora da essência.

2. Esta doutrina permite entender como a Santíssima Trindade pode manter-se incomunicável em essência e, ao mesmo tempo, vir e direcionar-se conosco, de acordo com a promessa de Cristo (Jo 15:23). A presença não e casual, tal como a onipresença divina na criação; não é mais uma presença de acordo com a essência – que por definição é incomunicável; É um modo segundo o qual a Trindade habita em nós por meio daquilo em si que é transmissível – ou seja, pelas energias que são comum as três hipóstases, ou, em outras palavras, pela graça – se for por este nome que conhecemos a deificante energia que o Santo Espírito comunica a nós. E ele que tem o Espírito, que concede os dons, tem ao mesmo tempo o Filho, através de quem os dons nos são transmitidos; Ele também tem o Pai, de quem vem todo dom perfeito. Ao receber o dom – a deificante energias – alguém recebe ao mesmo tempo a habitação da Santíssima Trindade – inseparável de suas energias naturais e presente nela de uma maneira diferente mas não menos verdadeiramente do que é presente em sua natureza;

3. A distinção entre essência e energia, que é fundamental para a doutrina da graça, permite torna possível o real significado das palavras de S. Pedro ‘participantes da natureza divina’. A união que somos chamados não é nem hipostática – como é o caso da natureza de Cristo – nem substancial, como é o das três pessoas divinas: é uma união com Deus nas Suas energias, ou união pela graça nos faz participantes da natureza divina, sem nossa essência torna-se como a de Deus. Na deificação, somos pela graça (ou seja, pelas energias divinas) tudo que Deus é pela natureza, exceto pela identidade da natureza, como nos ensina S. Máximos (De Ambiguis). Continuamos sendo criaturas enquanto nos tornamos Deuses pela graça, assim como Cristo continuou sendo Deus tornando-se homem pela encarnação.

Essas distinções em Deus que são feitas pela teologia da Igreja Oriental não contradizem de modo algum a sua atitude apofática em relação à verdade revelada. Ao contrário, essas distinções antinômicas são ditadas pela preocupação de salvaguardar o mistério, ao mesmo tempo em que expressam os dados da revelação no dogma. Assim, como vimos na doutrina da Trindade, a distinção entre as pessoas e a natureza revelou uma tendência a representar Deus como uma "mônada e tríade em uma", com a consequência de que a dominação da unidade da natureza sobre Evitou-se a trindade das hipóstases e eliminou ou minimizou o mistério primordial da diversidade identitária. Do mesmo modo, a distinção entre a essência e as energias deve-se à antinomia entre o incognoscível eo cognoscível, o incomunicável e o transmissível, com os quais o pensamento religioso ea experiência das coisas divinas são enfrentados. Essas distinções reais não introduzem nenhuma "composição" no ser divino; Eles significam o mistério de Deus, que é absolutamente um de acordo com Sua natureza, absolutamente três de acordo com Suas pessoas, a Trindade soberana e inacessível, habitando na profusão da glória que é Sua luz incriada, Seu Reino eterno que todos devem entrar que herdarão o estado deificado do mundo que há de vir."

(Vladimir Lossky, Teologia da Igreja Oriental. tradução de Wallyson de Saturnino.)


São Gregório Palamás, o Defensor dos Hesicastas e Pilar da Ortodoxia:

"Quem diz que a luz que brilhou ao redor dos discípulos no Tabor era um fantasma e um símbolo, que apareceu e desapareceu, que ela não existe por si própria e que não ultrapassa todo entendimento, mas que se trata de uma banal projeção do pensamento, está em manifesta contradição com as opiniões dos santos. Estes, com efeito, em seus cantos e seus escritos, a chamam de misteriosa, incriada, eterna, intemporal, inacessível, imensa, infinita, sem limites, invisível aos anjos e aos homens, beleza original e imutável, glória de Deus, glória de Cristo, glória do Espírito, raio da Divindade e outros nomes semelhantes. Esta dito, com efeito, que “a carne foi glorificada pela encarnação de Cristo, e que a glória da Divindade se tornou a glória do corpo. Mas no corpo manifestado a glória não aparece para aqueles que não trazem em si aquilo que mesmo para os anjos é invisível. Cristo se transfigurou, não por assumir o que ele não era, nem por se transformar no que não era, mas manifestando aos discípulos aquilo que ele é, abrindo os seus olhos e tornando videntes a eles que eram cegos. Ao mesmo tempo em que permanecia no mesmo estado no qual antes lhes aparecera, ele então se manifestou e se revelou aos discípulos. Pois ele é em si a verdadeira luz, a beleza da glória. Ele brilhou como o sol... A imagem não é justa, mas é impossível representar corretamente o incriado na criação”.

Aquele que diz que somente a essência de Deus é incriada, mas não as energias eternas – por que a essência as ultrapassa a todas como o operador supera o operado – que escute são Máximo, que afirma: “Tudo o que é imortal, e a própria imortalidade, tudo o que vive, e a própria vida, tudo o que é santo, e a própria santidade, tudo o que é virtuoso, e a própria virtude, tudo o que é bom, e a própria bondade, tudo o que é, e o próprio ser, são manifestamente obras de Deus. Mas alguns começaram a ser no tempo (pois houve um tempo em que não existiam), e outros não começaram a ser no tempo: pois jamais houve um tempo em que não existiam a virtude, a bondade, a santidade e a imortalidade”. E também: “A bondade e tudo o que está contido na palavra bondade, em suma, toda a vida, toda imortalidade, toda simplicidade, toda imutabilidade, toda infinitude e tudo o que é considerado em sua essência ao redor de Deus, são obras de Deus e não tiveram um começo no tempo. Pois aquilo que não era não pode jamais ser mais antigo do que a virtude, nem mais antigo que os demais caracteres de que falamos, mesmo que aquilo que deles participa tenha começado com eles a ser no tempo. Com efeito, toda virtude é sem começo, dado que o tempo não é mais antigo do que ela, pois a virtude possui em si a Deus que, somente ele, gerou o ser eternamente. Mas Deus se eleva infinitamente ao infinito acima de todos os seres, participantes e participados”.

Aprenda este homem com isto que todas as existências saídas de Deus não estão submetidas ao tempo. Pois entre elas existem algumas que são sem começo e que não são absolutamente apagadas pela Unidade trinitária, que somente ela é pura natureza sem começo, e pela simplicidade sobrenatural que nela reside. Do mesmo modo o intelecto, como uma imagem obscura desta indivisibilidade transcendente, através dos pensamentos que lhe são naturais, não é absolutamente composto.

Quem não aceita as disposições espirituais manifestadas diretamente no corpo pelos carismas do Espírito na alma daqueles que progridem em Deus, e chama de impassibilidade a mortificação habitual do estado passional, mas não a energia que leva normalmente para o melhor aquele que se desembaraçou totalmente do mal e se voltou para o bem, largando os maus hábitos e se enriquecendo com os bons, este, conforme ao que pensa, nega que o corpo possa levar sua vida naquilo que é eterno. Pois se um dia, por intermédio da alma, o corpo participar dos bens indizíveis, é provável que agora ele já participe, na medida do possível, da graça misteriosa e indizivelmente concedida por Deus ao intelecto purificado, e que ele se entregará por si só ao divino quando a parte passional da alma for transformada e santificada, mas não mortificada em seu estado. Uma vez que o corpo e a alma têm uma existência em comum, ela santificará então por si própria as disposições e as energias do corpo. Pois uma vez que for separado dos bens da existência pela esperança dos bens futuros, segundo são Diádoco, o intelecto, vigorosamente conduzido na ausência de cuidados, sentirá por si só o indizível odor divino. E ele transmitirá ao corpo sua própria doçura, na medida de seu progresso. Tamanha alegria, que sobrevirá então na alma e no corpo, é uma reminiscência infalível da vida incorruptível.

Uma é a luz percebida naturalmente pelo intelecto, e outra a luz percebida pelos sentidos. Pois os sentidos percebem o sensível, e os objetos sensíveis têm sua qualidade de objetos sensíveis. Mas a luz do intelecto é o conhecimento que reside nos pensamentos. Assim é que a vida e o intelecto não percebem a mesma luz, na medida em que cada qual opera segundo sua própria natureza e no domínio que se refere à sua natureza. Mas quando participam da graça e da potência espiritual, os que são dignos disto veem com os sentidos e com o intelecto aquilo que ultrapassa todo sentido e todo intelecto. E eles realizam tais milagres, como somente Deus sabe, para retomar o que disse o grande Gregório o Teólogo. É isto o que aprendemos das Escrituras, e o que recebemos de nossos Padres. É o que nos permite conhecer nossa minúscula experiência. É isto que, para a plena e segura informação dos que lerão este texto, junto com nosso venerado irmão entre os hieromonges, Gregório, que escreveu sobre os santos hesiquiastas seguindo rigorosamente as tradições dos santos, nós assinamos."

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